Enquanto escrevia esse conto, minha playlist sacaneou tocou With or Without You do U2, então nada mais justo que ela siga junto.
Um dia pra se esquecer …
Tem dia, não todos os dias, apenas alguns dias, esses dias em especial (não merecem essa palavra) ruins são feitos para serem esquecidos. Esquecidos?! me vem a dúvida será que são feitos pra se esquecer ou pra serem lembrados.
Teve um dia que eu perdi uma pessoa muita especial na minha vida, alguém que eu jamais achei que perderia. Alguém que pela ordem das coisas, pela ordem natural da vida deveria partir somente depois que eu aqui não mais estivesse. Nesse dia não fez sol, foi um dia nublado, um dia nublado em um lugar onde o sol brilha a maior parte do ano.
Nesse dia eu achei que o mundo se encerrava ali naquele momento, eu achei que nada mais fazia sentido. Naquele dia eu senti uma dor que jamais sentira, algo que vem doendo por dentro e que você só consegue traduzir em lágrimas e dor. Achei que aquela dor era eterna que não passaria nunca, que jamais voltaria a ver alegria em nada.
Ainda sim naquele mesmo dia, algo aconteceu comigo que no auge de minha dor não consegui enxergar. Só depois pude notar que do mesmo jeito em que se perdia algo tão precioso eu ganhava um outro bem tão grande quanto. Naquele dia, eu descobrira uma outra pessoa que estava comigo, que me apoiava e que me dava forças pra continuar a caminhar e a seguir em frente. Começava aqui uma dívida que jamais poderia pagar.
Não que eu já não tivesse notado aquela pessoa, ela ao contrário sempre esteve comigo, porém ela tinha uma força que até então desconhecia. Era uma pessoa que tinha uma luz que naquele momento iluminava e também guiava. Sentia-me seguro ao ser segurado por sua mão e que dessa forma me mostrava o melhor caminho a seguir naquele dia nublado.
Esses dias aos poucos foram passando, nunca esquecidos, porém outros dias vieram e o sol voltou a brilhar novamente. E assim foram ao longo de dias, meses e anos até que uma nova luz surgiu, algo que eu mesmo sempre vi com descrença e hoje acredito que foi a melhor coisa que me aconteceu nesta vida. Novamente pela segunda vez nessa nossa breve existência eu tinha consciência que minha divida impagável aumentava.
Eu era agraciado com algo que tinha medo de ter, algo que tinha medo de assumir, que tinha medo de não conseguir ser uma boa pessoa, uma boa referência. Ainda sim nesse dia, essa pessoa lá estava e me mostrou o caminho a ser seguido, lá estava eu sendo guiado novamente.
Porém, naquele dia eu me transformava em alguém que eu nunca imaginara que seria, começava ali um processo sem volta. Naquele dia, eu deixava de ser o guiado para começar a minha própria trajetória de condutor. Eu começava a percorrer um novo caminho que só me trouxe alegrias, que só me trouxe dias e mais dias ensolarados.
(In)felizmente ontem não fez sol, ontem o sol não brilhou e o dia nublado dessa vez voltou acompanhado de vento e frio. Ontem foi mais um daqueles dias que a dor fala mais alto, que ela vem por dentro de ti e vai te sufocando como se soubesse que não conseguirá sobreviver para ver o dia seguinte. Esses dias nublados parecem ter o poder de ter mais que 24h, parece fazer com que o relógio diminua a velocidade e mexa-se cada vez mais devagar.
Mais uma vez uma luz se apaga, mais um dia pra (não) esquecer. Nesses dias você tem que enxugar as lágrimas que insistem em atrapalhar sua visão e olhar para todos os lados. Ver que você há muito tempo deixou de ser apenas o conduzido, para ser o guia para muitos. Assim como naquele outro dia cinza, nada jamais será esquecido, não tem como. Mas é preciso aprender a caminhar novamente por esse dia nublado, a responsabilidade agora é maior.
Neste dia de dor, não é o momento de deixar que a sua própria luz se apague e se perca. Pode ser que nesse dia, se você olhar bem, mas bem mesmo, no meio de toda essa escuridão desse dia, você consiga ver que uma outra luz já brilha ao seu lado e já te acompanha a muito tempo. E se nesse outro dia você ainda sim não conseguir ver, seque as lágrimas e olhe novamente em um novo dia. Certamente algum dia você a encontrará (ou ela te pode te achar primeiro) pois nós nunca estamos só.
– – – – –
Ao reler o texto vi que escrevi 37 vezes a palavra “dia” (38 com essa) nesse pequeno conto. Acho que jamais conseguirei ser um escritor de verdade 🙁 porém pra mim isso não faz a menor diferença 🙂 Mais devaneios aqui.